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O preconceito me fez ir mais longe




Obrigado por me discriminarem. Vocês me transformaram em um vencedor

por Antonio Marcello em

Aos 9 anos de idade eu já ouvia “viadinho”, “bichinha”. Pra mim, não tinha relação alguma com orientação sexual. Eu era tão ingênuo que não imaginava o que ser gay significava; tinha a visão educada pela televisão: gays são aqueles que usam plumas e maquiagem. Por isso eu não entendia por que me chamavam disso.
Com 11 anos decidi acompanhar minha mãe em cultos evangélicos. Eu só assistia a um canal de televisão, usava um cordão no braço que me identificava como participante do Grupo Jovem da Igreja, onde gays e lésbicas eram sempre mencionados como pessoas possuídas pelo demônio. E a confusão continuava na minha cabeça.

Foi nessa época também que abandonei o colégio por 1 ano. Eu não suportava mais apanhar, ser xingado, sem nem saber o motivo. Todos os dias eu chorava escondido no banheiro e por várias vezes ficava andando por horas para fingir que tinha ido na escola. Não aguentei. Minha mãe chegou a ir na escola, cogitando até um abuso sexual.

Eu era diferente dos outros meninos. Não me interessava por revistas de mulheres nuas e nem olhava para outras meninas. Eu achava que era por causa da minha idade e que daqui a pouco ia ser mulher pra cá, mulher pra lá.

Isso nunca aconteceu e eu continuei apanhando na rua onde morava, cuspiam em mim, me xingavam sem parar. Eu era diferente, mas acreditava que me chamavam de “viadinho” pois eu só morava com mulheres.

Com 13 anos finalmente descobri o que significava ser gay mas não tinha consciência que eu era – mesmo após ter beijado outro menino. Tudo era muito precoce e era muita informação ao mesmo tempo. Eu já não ia mais na igreja, pois até do Grupo Jovem eu fui excluído. Decidi me isolar e fui tomado por uma depressão.

Eu não tinha amigos, tinha medo de falar o que eu sentia mas algo sempre me estimulou a nunca deixar de ser quem eu era – embora eu nem soubesse ao certo. Mergulhei em livros e decidi aprender além do que a escola e a família ensinavam. Eu queria ser excepcional no que eu escolhesse fazer, pois imaginava que só assim eu seria respeitado por quem eu sou. Aos poucos comecei a me fortalecer.

Dos 16 anos em diante muita coisa mudou. Misturado aos problemas familiares que me obrigaram a amadurecer mais rápido do que o normal, eu comecei a trilhar um caminho de auto-aceitação. Não frequentava baladas gays, nem bares e encontrei o conforto em diversos amigos virtuais que mantenho até hoje.

Eu tinha consciência de que eu não poderia ter uma vida escondida, virtual e  jamais suportaria ser um personagem heterossexual. Muito pelo contrário. Eu sabia que era gay e queria mostrar às pessoas que elas estão erradas, que eu sou normal e igual a elas, sem a pretensão de ser um militante dos direitos LGBT.

Aos poucos comecei a falar com amigos, colegas de escola. No meu primeiro emprego, aos 17 anos, todos sabiam sobre a minha sexualidade. Entrei em uma das melhores faculdades do Brasil e todos na sala sabiam que eu era gay, o que de repente virou um atrativo. Ao invés de eu ser humilhado como na época da escola, as pessoas se aproximavam de mim com curiosidade. Eu, com receio, tinha o hábito de afastá-las mas não durou muito tempo.

Minha família, em especial minha mãe, foi a última a saber. A princípio ela reprovou, ficamos sem nos falar. Em menos de 24h ela me chamou pra conversar, pediu desculpas, me abraçou e disse: “Fico feliz em saber pois agora vou poder participar da sua vida”. Percebi que, finalmente, eu não precisava me esconder.

Hoje todos os meus amigos, meus ex-colegas de trabalho, minha família e todos que fazem parte do meu convívio sabem que sou gay e me respeitam. Namoro há quase 8 anos e meu namorado também é aceito por todos.

Cresci em um ambiente religioso, de repressão, de machismo. Ao contrário do que fui educado a vida toda, eu não me sinto diferente por ser gay. Eu me sinto normal pois sou normal. Hoje, consegui mudar a opinião das pessoas. Piadas sobre homossexuais são proibidas dentro da minha casa e até minha irmã de 10 anos já sabe que tenho um namorado.

Eu poderia ter me escondido, cedido a toda pressão e provavelmente hoje eu seria um depressivo, iludindo alguma mulher e seguindo os padrões estabelecidos pelas pessoas ao meu redor em um teatro sem fim.

A única escolha que fiz em minha vida foi ser feliz como sou. Todo o preconceito que sofri me estimulou a ir mais longe, a lutar, a me aceitar ainda mais e mostrar às pessoas ao meu redor que eu sou tão bom quanto elas e que, no fundo, a diferença está na cabeça de cada um.

Hoje eu gostaria de encontrar todos que me discriminaram, me humilharam. Não por vingança, mas porque gostaria de agradecê-los. Todo o preconceito e humilhação me fez ir mais longe, me transformou em um homem com orgulho do que sou e muito mais forte do que qualquer um deles conseguiria ser. Eu queria olhar no olho de cada um, com a cabeça erguida e dizer: Obrigado, vocês me transformaram em um vencedor.

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