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Negociando para formar uma família

Divulgação - Uma das atividades foi desenhar o núcleo familiar: todas as crianças que tinham algum animal de estimação o consideravam como membro da família  

por Elena Mandarim

É certo que ninguém discorda da premissa de que "a família é a base de tudo". Contudo, em um mundo contemporâneo, como podemos definir exatamente o que é família? Esta é, sem dúvida, uma definição bem difícil. Atualmente, há uma grande diversidade de configurações familiares, em virtude, principalmente, do crescente número de recasamentos, sejam eles formalizados ou não. Anna Paula Uziel, que é Jovem Cientista do Nosso Estado, da FAPERJ, e professora do Instituto de Psicologia, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), está à frente de um projeto que tem como objetivo pesquisar como essas transformações sociais têm impactos na vida de crianças de diferentes classes sociais. "É fundamental conhecer o que eles pensam sobre família, quem consideram como seus irmãos e parentes, como nomeiam adultos e outras crianças ao seu redor", afirma a pesquisadora.

Anna Uziel: ouvir as crianças é fundamental para entender os novos formatos de família

Em uma primeira etapa da pesquisa – que resultou na dissertação de mestrado de Gizele Bakman, defendida em março de 2013 –, Anna explica que foram formados seis grupos com cinco crianças, cada uma de uma organização diferente de família. "A ideia foi mesclar as crianças de forma que em cada reunião houvesse representantes com formatos familiares distintos", relata a pesquisadora. Ela ressalta que os grupos foram montados de acordo com o que se tem observado ser mais comum nas novas famílias. "É cada vez mais frequente, por exemplo, observar um recasamento em que os filhos da mulher e os do homem passam a conviver e ainda ganham um novo irmão em comum, fruto desse novo casamento. Outras formações corriqueiras são crianças que moram com a mãe e a avó; crianças que moram somente com a mãe ou somente com o pai; crianças adotadas que são inseridas em uma família já estabelecida; entre outros."

O objetivo da pesquisa foi propor diferentes atividades e discussões para estimular essas crianças a expor suas opiniões. Segundo a psicóloga, durante a reunião com cada grupo, vários temas foram apresentados. "Na época, trouxemos até um caso que estava sendo mostrado em uma novela global, que discutia quem deveria ser a mãe de uma criança gerada por inseminação artificial: a mulher que doou o óvulo ou a que teve a gestação. Esta questão foi interessante porque percebemos que as crianças basearam a discussão em quem tinha mais direitos sobre o bebê. Outra atividade também muito enriquecedora foi quando pedimos que elas fizessem um desenho sobre suas famílias. Nesse caso, por exemplo, ficou claro que todas as crianças que tinham algum animal de estimação o consideravam como membro da família", relata Anna. Ela lembra que a pesquisa foi desenvolvida com a aprovação do comitê de ética em pesquisas com crianças, da Uerj.

Em outra parte da pesquisa, a equipe acompanhou grupos de irmãos em instituições de acolhimento institucional. O objetivo foi buscar entender como o afastamento das figuras materna e paterna, algumas vezes até por morte, pode influenciar na reorganização da família restante. "Percebemos que a rede formada pelos irmãos costuma ser muito consistente. Em geral, os mais velhos se tornam referências para os mais novos. Já as figuras dos adultos, da família extensa ao abrigo, por exemplo, aparecem pouco", conta Anna. Para ela, esta pesquisa pode dar uma boa contribuição para se pensar as políticas de assistência. "Atualmente, a maioria dos abrigos é organizada por sexo e idade, o que muitas vezes inviabiliza que os irmãos se mantenham juntos. Pelo o que estamos percebendo, o ideal devia ser formar uma estrutura que priorizasse, ao máximo, a manutenção dos laços familiares. Da mesma forma que, à medida que vão saindo abrigo, as políticas de assistência devem promover um trabalho de fortalecimento desses vínculos, já que, na maioridade, os irmãos contam certamente uns com os outros."

Segundo a pesquisadora, é claro que o contexto socioeconômico influencia o modo de perceber essas novas relações, ou seja, nas classes mais favorecidas é comum a família tradicional – pai, mãe e filhos –, enquanto nas menos favorecidas há uma diversidade maior de formações familiares. Anna conta que uma conclusão muito relevante foi observar que, em geral, o público infanto-juvenil está sempre negociando quem vai entrar e quem vai sair da família, sob três aspectos: relações de parentesco sanguíneo, afetividade e convivência. "As crianças não possuem as amarras dos adultos, então, não se sentem inibidas de excluir ou incluir alguém em sua classificação de família. Ou seja, se o pai não for próximo ou não conviver com a criança, por exemplo, ela não tem pudor em tirá-lo dessa classificação. Ou ainda se um adulto tiver uma relação de afetividade com a criança, mesmo sem laços sanguíneos, ela facilmente o inclui na família, sem se preocupar com um título ou um vínculo que o insira no núcleo familiar", exemplifica Anna.

A psicóloga ressalta que, nos últimos anos, inúmeras têm sido as discussões sobre família. As mudanças sociais observadas, principalmente nos anos 1960 e 1970, imprimiram transformações substanciais na forma de relacionamento dos casais e na estruturação dos núcleos familiares. Sem dúvida, essas variações têm impacto direto na vida das crianças, que acabam sendo sujeitos de suas histórias. Mas, se por um lado não podem tomar decisões sozinhas, por outro é fundamental que sejam ouvidas. "Essa pesquisa busca justamente começar a levantar dados para que possamos compreender como essas novas relações estão produzindo novos olhares sobre a família. Nesse sentido, as crianças podem nos fornecer olhares e opiniões mais livres, já que não são tão presas a certas formalidades, como laços de sangue, genéticos e questões jurídicas", conclui Anna.



Divulgação - Na primeira figura, a criança inclui todos os tios na sua família, o que mostra a proximidade. No outro desenho, a criança inclui a avó recém-falecida 

Fonte: FAPERJ

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